Quando o político catarinense Jorge Bornhausen se elegeu senador pela primeira vez, pediu conselhos ao já senador pernambucano Marco Maciel, àquela altura já um veterano ocupante de uma vaga no parlamento. Marco Maciel lhe passou a seguinte recomendação: “Chegue em Brasília na segunda-feira. Evite participar de CPI e da Comissão de Orçamento”.
Chegar na segunda-feira era uma garantia de conseguir se inscrever para falar na sessão de debates no plenário. Algo que, ao longo do tempo, pode ter mantido respeitabilidade, mas perdeu relevância, com o avanço da comunicação dos políticos via redes sociais. Palco mesmo os políticos ganham ao participar de Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs). E dinheiro e poder nos seus estados e municípios, quando definem as verbas milionárias do orçamento.
O conselho dado por Marco Maciel a Bornhausen, que se tornaria um de seus amigos mais próximos, define “O Estilo Marco Maciel”, título da sua biografia, de autoria do jornalista pernambucano Magno Martins, que será lançada nesta quinta-feira (24) no Rio de Janeiro, em cerimônia na Academia Brasileira de Letras (ABL). Marco Maciel ocupou a cadeira de número 39 da ABL, que antes foi de Roberto Marinho, e hoje é ocupada por José Paulo Cavalcanti.
Ao longo de sua longa carreira político, Marco Maciel optou por ser discreto. Como aconselhou a Bornhausen, evitou postos que poderiam lhe garantir brilho rápido, poder e dinheiro, mas também envolvimento em polêmicas e acusações à sua reputação. Ao longo de sua carreira, ocupou todos os cargos públicos de relevância que podem caber a um político. Foi deputado, senador, governador, ministro. Ocupou por 86 vezes a Presidência da Reública, substituindo Fernando Henrique Cardoso, de quem foi vice-presidente em seus dois mandatos, entre 1995 e 2003.
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Extremamente alto e magro, Marco Maciel tinha o apelido de “Mapa do Chile”, comprido e estreito. Associando-se sua magreza à sua discrição, brincava-se em Brasília, que Maciel era tão magro e tão discreto que quando estava de frente achava-se que ele estava de lado; quando estava de lado achava-se que ele já tinha ido embora.
As características de ser leal e discreto conferiram a Marco Maciel, na avaliação de Fernando Henrique Cardoso, o perfil de “vice dos sonhos”. Segundo Fernando Henrique, Maciel nunca praticou algum ato do qual ele discordasse. Nunca lhe deu trabalho. Nunca tramou contra ele.
Tais características, porém, tornaram Marco Maciel um dos principais articuladores políticos do país. Ele foi um dos principais artífices da Aliança Democrática, movimento que levou à eleição de Tancredo Neves como presidente da República, em 1985, no Colégio Eleitoral, pondo fim à ditadura militar.
Antes da eleição, Maciel era um dos pré-candidatos à Presidência, pelo PDS, partido que apoiava o regime militar. Então senador, ele renunciou ao cargo para apoiar Tancredo, na disputa que faria contra Paulo Maluf. E articulou a dissidência do PDS, que levaria á fundação do PFL e sua associação com o MDB para eleger Tancredo.
Foi neste momento que a vida de Maciel se aproximou à de Magno Martins. O jornalista tornou-se seu assessor naquele momento, e acompanhou de perto tais articulações. Inicialmente, as reuniões para apoiar Tancredo aconteciam na Biblioteca do Senado. Quando a imprensa descobriu, passaram a ser na casa de Maciel.
O caráter conciliador de Maciel revelou-se em algumas ocasiões. Quando se convergiu para a ideia de que José Sarney, que saiu da presidência do PDS para a dissidência, fosse o vice de Tancredo, perguntou-se em uma reunião o que os demais achavam de Sarney. O então senador gaúcho Pedro Simon não teve dúvida e começou a fazer comentários desairosos lançando suspeitas quanto à honestidade de Sarney. O futuro vice de Tancredo quis desistir e abandonar tudo. Foi Maciel quem fez com que Simon pedisse desculpas e que Sarney recuasse.
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Fazia parte também do estilo Marco Maciel dormir pouquíssimo e praticamente não comer. Certa vez, uma sessão de autógrafos de um livro do senador estendeu-se pela madrugada. Um político do Nordeste só conseguiu a sua vez às 2h30 da madrugada. Pediu, então: “Senador, além do autógrafo, pode, por favor, a hora. Minha mulher não vai acreditar que eu estava aqui até essa hora para pegar seu autógrafo”.
Em uma campanha, depois de viajar por horas, Maciel chegou a uma lanchonete do aeroporto e pediu: “Uma Coca e um sanduíche”. O acompanhante respondeu: “Também estou com fome”. E Maciel: “A gente divide”.
O livro de Magno traz ainda um emocionante depoimento de Ana Maria Maciel, viúva do ex-senador e ex-vice-presidente, sobre seus dez anos de sofrimento, vítima do Mal de Alzheimer. O político pernambucano, dono até então de uma memória privilegiada, que lhe permitia guardar nomes de centenas de políticos e as datas dos seus aniversários, começou a ver seu cérebro corroído pela doença, sob o testemunho de Ana Maria.
O advogado, professor de Direito e político pernambucano faleceu em Brasília no dia 12 de junho de 2021. “É preciso que as futuras gerações tenham a memória de um dos mais importantes nomes da política brasileira do final do século passado”, avalia Magno Martins. “É para essas novas gerações que é feita essa biografia”.
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