Foto: Tero Vesalainen/Getty Images
Confesso que não fiquei surpreso ao ver a reação da Kantar Ibope ao crescimento da CazéTV. Durante evento realizado na sede da Record, em São Paulo, o instituto apresentou os primeiros dados de seu novo serviço de medição, que unifica TV aberta, TV paga e streaming. Mas, ao invés de um avanço, o que vimos foi uma tentativa explícita de minimizar o impacto de uma nova realidade midiática.
Vamos aos fatos: a CazéTV, transmitindo pelo YouTube, atinge milhões de pessoas por meio de dispositivos diversos — smart TVs, celulares, tablets, notebooks. É um fenômeno real, mensurável, palpável. Ainda assim, o instituto que há décadas monopoliza a medição de audiência no Brasil não aceita que um canal digital possa ter mais visibilidade do que uma emissora tradicional. E o pior: insiste em defender um modelo que não representa mais o comportamento de consumo do público.
>>>SIGA O YOUTUBE DO PORTAL TERRA DA LUZ <<<
A lógica do peoplemeter é simples: se alguém passou um minuto na frente da TV, a audiência é registrada. Não importa se ficou uma hora ou apenas trocou de canal por engano. E tudo isso a partir de uma amostra extremamente limitada. É como tentar medir a força do oceano com um copo d’água.
Enquanto isso, plataformas como o YouTube trabalham com métricas altamente precisas, transparentes, abertas ao público. Sabemos quantas pessoas assistiram, por quanto tempo ficaram, como interagiram, onde clicaram. Isso, para mim, é audiência de verdade.
Quando a CazéTV atinge mais de 5 milhões de acessos simultâneos, isso precisa ser respeitado como um dado legítimo e relevante para o mercado. Dizer que esses números estão “turbinados”, como insinuou a Kantar, é, no mínimo, desonesto — e, no máximo, uma estratégia desesperada de quem sente sua hegemonia ameaçada.
Não é de hoje que critico o modelo da Kantar. Já escrevi, já comentei em eventos, já defendi publicamente: a régua com a qual estamos medindo a audiência no Brasil está ultrapassada. E o mais grave: esse modelo antiquado ainda orienta decisões de investimentos publicitários, programação e estratégias de comunicação de marcas e veículos.
Por isso, quando vi a reação da Kantar, o que me veio à cabeça foi uma expressão que aprendi nos bancos da faculdade de Direito, na Universidade de Fortaleza, com o tom jocozo do próprio cearense nas mais variadas situações: “jus sperniandi” — o “direito de espernear”. É exatamente isso que está acontecendo. Diante da ascensão de novas plataformas, o instituto esperneia. Esperneia porque não quer reconhecer que a lógica da audiência se transformou. Esperneia porque não consegue (ou não quer) acompanhar essa transformação.
Mas o público já mudou. A forma de consumir conteúdo mudou. A comunicação mudou. E, gostem ou não, o mercado também vai mudar. Resta saber até quando aceitaremos que o que é considerado “sucesso” continue sendo definido por uma metodologia míope, elitizada e insuficiente.
Chegou a hora de olhar para os dados de forma mais plural, mais justa, mais representativa da realidade brasileira. Porque audiência, hoje, não se mede apenas pelo que passa na TV. Audiência se mede onde o público está — e o público está em todo lugar.
Hermann Hesse é jornalista formado pela Universidade Federal do Ceará (UFC) com atuação na TV cearense desde 1990. Atualmente é o editor responsável pelo Portal Terra da Luz.
O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Portal Terra da Luz. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, ou um outro artigo com suas ideias, envie sua sugestão de texto para portalterradaluz.
Leia também | Fortaleza ganha novo voo internacional da Air France vindo da Guiana Francesa