Um sindicância realizada em documentos da Fecomércio-CE revelou uma fraude milionária na compra de um terreno, em Fortaleza, por mais de R$ 6 milhões. Logo que retornou à presidência da entidade, após um período de licença, Luiz Gastão Bittencourt tomou conhecimento das possíveis irregularidades e solicitou ao atual Diretor Regional do Sesc, Henrique Javi, a abertura de sindicância.
As apurações identificaram uma série de transações suspeitas e procedimentos fora dos padrões do sistema. Entre as situações mais graves identificados na investigação, está a intermediação do negócio conduzida diretamente por um amigo pessoal do ex-presidente da Fecomércio-CE, Maurício Filizola. O advogado Francisco José Nunes Freitas, contratado do Sesc, aparece como intermediário na transação imobiliária sem nenhum mandato para isso. Segundo as investigações, Freitas recebeu valores por meio de contas bancárias da esposa, que estão identificados em extrato bancário como “Devolução de valor ao advogado da Fecomércio”. O prejuízo ultrapassa os R$ 600 mil.
O terreno que é objeto da denúncia tem 19 mil metros quadrados e fica na Avenida Washington Soares, uma das mais movimentadas de Fortaleza. O imóvel foi apresentado numa reunião do Conselho do Serviço Social do Comércio (Sesc), que integra o Sistema Fecomércio, pelo então presidente Maurício Filizola.
O terreno, que teria valor venal de R$ 8,5 milhões, teria sido “bem negociado por 6,3 milhões”, aponta o relatório da sindicância, que segue informando que, sob o pretexto de um “excelente negócio” obtido com a suposta redução de valores, o Conselho aprovou a compra. O Sesc efetuou o pagamento de um sinal de 10% do valor negociado, ou seja, R$ 630 mil, em junho de 2019.
Ocorre que o imóvel pertence a herdeiros e estava arrolado em um espólio, com a documentação incompleta e impostos atrasados. Para regularizar a situação, seria necessário um novo depósito por parte do Sesc de mais 15%, R$ 945 mil. Este depósito foi feito em 14 de fevereiro de 2020, de forma completamente ilegal, fora de qualquer regra ou padrão do sistema, sem as devidas autorizações do Conselho Regional do Sesc ou Conselho Nacional.
E mais: ficou comprovado, por meio de documentos apresentados pela vendedora do terreno, que foram feitos depósitos devolutivos de parte do valor pago pelo Sesc a quem ela considerava fazer parte da instituição e do negócio. A informação foi confirmada por documento pelos proprietários do imóvel.
Em um dos depósitos identificados constava a seguinte descrição: “Devolução de valor ao advogado da Fecomércio”. O referido depósito, no valor de R$ 385 mil, foi efetuado na conta da esposa do advogado e amigo do ex-presidente, Francisco José Nunes Freitas. Também foram descobertos um segundo depósito, no valor de R$ 10 mil, na mesma conta; um terceiro depósito, no valor de R$ 40 mil, efetuado na conta de outra pessoa física, com dizeres “Grupo Sesc” e “Depósito Grupo Sesc”, sendo que nenhuma dessas pessoas trabalha ou presta qualquer serviço à instituição. Há ainda outros R$ 200 mil que foram depositados em contas de outras pessoas físicas e que também se tornaram motivo de apuração pelo Sesc-CE.
Em resumo, do valor do sinal e do segundo pagamento, que juntos somam R$ 1.575 mil, ficou comprovado que R$ 635 mil foram devolvidos pela vendedora.
Assim que recebeu o resultado da sindicância, em formato de relatório, o atual presidente da Fecomércio-CE, Luiz Gastão Bittecourt, convocou reunião extraordinária do Conselho de Representantes da instituição e expôs as irregularidades. Ficou decidido por 14 votos contra 4, pelo cancelamento da compra do terreno, defendida anteriormente pelo ex-presidente Maurício Filizola.
Agora, toda a documentação sobre a denúncia recolhida durante a sindicância será entregue ao Ministério Público do Ceará (MPCE) e ao Tribunal de Contas da União (TCU) para as devidas providencias legais.
Em nota, a Fecomércio-CE informa que decidiu trazer esse assunto a público a fim de reafirmar o compromisso da entidade com a ética e a transparência. “O objetivo é preservar a postura do Sesc enquanto instituição reconhecida por sua capacidade de servir à sociedade, educar, promover a cultura, o lazer, o esporte e a acessibilidade a todos os serviços sociais disponíveis”, diz a nota.
A Fecomércio-CE também enfatiza que não medirá esforços para que “os valores subtraídos ilegalmente sejam integralmente ressarcidos à instituição, que não compactua com qualquer ilicitude e reafirma o compromisso com a honestidade. As irregularidades serão apuradas e os responsáveis punidos, conforme a Lei, com base nos fatos apurados pela sindicância interna e apresentados em reunião extraordinária do Conselho Regional para deliberar sobre o assunto, que, após ouvir relatório do conselheiro Wellington, representante do Ministério do Trabalho, demonstrando que todo o processo se encontrava eivado de vícios e sem cumprir as formalidades legais da instituições, aprovou também distrato do imóvel”, conclui a nota.
O Portal Terra da Luz entrou em contato com ex-assessores e também tentou falar com o ex-presidente da Fecomércio-CE, Maurício Filizola. Uma ex-assessora informou que não mantém mais contato com Filizola. O telefone celular estava desligado e ele não retornou a ligação e nem a mensagem enviada às 15h10, desta segunda-feira (27/9), com o pedido de explicações sobre a negociação do terreno. A reportagem foi concluída às 18h43.
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