Uma fonte de renda muitas vezes invisível aos olhos da maioria e ainda pouco explorada. Fora a questão econômica, um ganho incalculável para o meio ambiente e o fortalecimento do conceito de desenvolvimento sustentável da sociedade. É em busca de fortalecer a prática da coleta seletiva antes que os resíduos cheguem aos aterros sanitários e/ou lixões ainda existentes que o Governo do Ceará está trabalhando em parceria com os municípios. Até o momento, 169 prefeituras cearenses já aderiram ao Plano de Coletas Seletivas Múltiplas e devem, até 2023, estar com suas centrais de coleta construídas ou em fase final de edificação.
Esses espaços serão utilizados prioritariamente por recicladores que, hoje, já realizam esse trabalho nas ruas e avenidas das cidades cearenses. O modelo de parceria adotado ajuda a gerar renda para os catadores e a levar mais dignidade a esses autônomos.
“Fizemos parcerias com os municípios para que todos tenham seus locais de reciclagem, juntamente com as associações de catadores”, disse o titular da Secretaria do Meio Ambiente do Ceará (Sema), Artur Bruno.
Ao reduzir o volume de resíduos a ser enviados aos aterros, menor será a área utilizada, consequentemente diminuindo o custo de instalação e manutenção, dando uma vida útil maior a esses equipamentos. Só irá para o aterro sanitário o que não for mais possível ser reutilizado ou reciclado.
“As centrais de resíduo valorizam a política ‘pré-aterro’. É a possibilidade de você separar e comercializar os resíduos que tenham algum valor, evitando que eles cheguem para a disposição final, no caso aterros sanitários ou lixões”, explicou André Pereira, técnico da Coordenadoria de Desenvolvimento Sustentável da Sema.
O Ceará criou, em 2016, sua Política de Resíduos Sólidos, na qual prevê a coleta seletiva como forma preferencial, sendo necessário que os resíduos sejam segregados no próprio município de origem.
Dando continuidade à fortificação dessa metodologia de separação, já em 2018 o Estado finalizou os planos regionais de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos das suas regiões. Dentro desse planejamento, 21 consórcios públicos (com adesão de 169 municípios) para a construção de aterros sanitários já foram formalizados. Para apoiar os municípios cearenses que aderiram ao Plano de Coletas Seletivas Múltiplas a implementarem as instalações necessárias, o Governo do Ceará alterou os critérios de repasse dos 2% do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).
De acordo com o Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), o Ceará produz 3.534.660 toneladas por ano de resíduos sólidos. Dessas montanhas de lixo, muita coisa pode ser utilizada novamente se reaproveitada ou reciclada. “O ideal é que esses resíduos possam ser separados, segregados, valorizados e vendidos para gerar renda e emprego, principalmente no grupo de catadores, que pode participar desse processo efetivamente na operação das centrais municipais de resíduos. São pessoas que já trabalham com isso e devem ser inseridos nesse processo”, destacou André Pereira.
Para o presidente da Associação das Gestões Ambientais Locais do Ceará (Agace) e superintendente do Consórcio Público de Manejo dos Resíduos Sólidos da Região Metropolitana, Elano Damasceno, olhar para esse nicho é fundamental e traz ganhos para vários segmentos.
“Os resíduos, quando destinados corretamente, promovem renda e possibilitam a inclusão dos catadores na cadeia produtiva desse grandioso mercado, traduzindo-se também em política social”, assim enxerga.
Para ele, a iniciativa “possibilita o cumprimento das Leis, dando resolutividade a grandes problemas inerentes aos municípios, que, sozinhos, poucas chances têm de solucionar os problemas advindos dos lixões”, acredita Dasmaceno.
Atualmente, o Ceará já paga 1/4 de um salário mínimo a cerca de 2.500 catadores através do Programa Auxílio-Catador. “Hoje, os catadores ligados a associações e cooperativas estão recebendo um pagamento por serviços ambientais. O Governo do Ceará paga R$ 275 como complemento de renda (ao catador) por fazer reciclagem em nosso estado”, informou Artur Bruno.
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Localizado a cerca de 170 km de Fortaleza, na região do Vale do Jaguaribe, o município de Morada Nova trabalha a questão da coleta seletiva junto à população há três anos. Em 2021, a Prefeitura resolveu avançar nessa questão e abriu sua Central de Reciclagem (Russas, Sobral e Limoeiro do Norte também já estão com as suas em operação), por onde mensalmente passam toneladas de resíduos. A boa notícia é que uma parte considerável está tendo um destino diferente.
“Recolhemos em torno de 25 a 30 toneladas, sendo triadas e aproveitadas em média 18 toneladas de resíduos recicláveis, que são comercializados. Assim, em média conseguimos reaproveitar/reciclar 70% dos materiais com a coleta seletiva”, informou a servidora do Instituto do Meio Ambiente de Morada Nova e responsável pela Central de Reciclagem, Liz Bezerra.
Todo o material segregado para reaproveitamento é comercializado com empresas locais e de outros municípios. Os valores recebidos são rateados entre os profissionais que trabalham com a coleta seletiva no município. Atualmente, 12 pessoas vinculadas à única associação de catadores existente no município atuam diretamente na coleta e separação.
A perspectiva é de que esse número cresça após a aquisição de prensas, balanças e demais equipamentos. Atualmente, mais de 100 trabalhadores estão cadastrados na associação.
Liz Bezerra acredita que com a central de reciclagem em funcionamento o engajamento dos moradores vai aumentar na separação correta dos resíduos gerados em casa.
“Ficou mais visível para a população todo o trabalho que já vinha sendo realizado. Facilitará o trabalho de educação ambiental que objetiva o encerramento do lixão, tendo em vista os vários projetos que já vinham sendo sonhados coletivamente e que são hoje uma realidade, como a Central Municipal de Reciclagem. Assim, esperamos que a cada dia os números apontem para mais pessoas adotando a coleta seletiva”, planeja.
É preciso ter em mente que a decisão de implementar a política de coleta seletiva tem que ser pensada a longo prazo. Na visão de André Pereira, “é um processo (continuado), não é algo de imediato que vai dar efeito”. Para o técnico da Sema, “à medida que os municípios forem aderindo e implementando os equipamentos ‘pré-aterro’ é que os resíduos gradativamente vão passar a ser recuperados e segregados, não sendo dispostos em aterros ou lixões, diminuindo a quantidade de lixo que vai ser disposto”.
A perspectiva, na visão de Elano Damasceno, é que todos os municípios cearenses se engajem no Plano de Coletas Seletivas Múltiplas. “Há uma grande probabilidade de que os 15 Municípios cearenses, ainda não consorciados, possam aderir em virtude da importância do consórcio na solução para a erradicação dos lixões, por causa do recebimento dos valores em sua totalidade do ICMS Ecológico” pontuou o presidente da Agace.
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