Foi uma mega investigação, que envolveu 615 jornalistas de 149 veículos em 117 países. No Brasil, fizeram parte da apuração jornalistas do site Poder360, da revista “piauí”, da Agência Pública e do site Metrópoles. A reportagem, batizada de Pandora Papers, foi obtida por meio da análise de 11,9 milhões de documentos de escritórios administradores de offshores em todo o mundo, aos quais o Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ) teve acesso. O vazamento de dados expõe contas em paraísos fiscais de 330 empresários, artistas e políticos de 91 países e territórios que têm ou tinham empresas fora do domicílio fiscal de origem e abertas em locais conhecidos como paraísos fiscais, pois cobram pouco ou nenhum imposto e protegem o sigilo bancário do cliente.
O material foi analisado durante um ano e a série de reportagens foi divulgada neste domingo (3/10). No Brasil, o Ministro da Economia, Paulo Guedes e o presidente do Banco Central do Brasil (BC), Roberto Campos Neto, são citados. Os documentos secretos também listam negociações envolvendo líderes mundiais, como o rei da Jordânia; os presidentes do Quênia e Equador; o primeiro-ministro da República Tcheca (leia mais sobre eles ao final desta reportagem). Pessoas próximas ao presidente da Rússia, Vladimir Putin, também aparecem na relação.
Segundo o ICIJ, Guedes e Campos Neto tinham empresas em paraísos fiscais e mantiveram os empreendimentos mesmo depois de terem entrado para o governo do presidente Jair Bolsonaro, no início de 2019. Ambos negam irregularidades nas suas empresas mantidas no exterior (leia abaixo no tópico ‘Respostas Oficiais’).
No caso de servidores públicos brasileiros, o artigo 5º do Código de Conduta da Alta Administração Federal, de 2000, proíbe funcionários do alto escalão de manter aplicações financeiras – no Brasil ou no exterior – que possam ser afetadas por políticas governamentais (leia mais no tópico ‘Código de Conduta’).
A offshore é um instrumento que pode ser usado legalmente para fazer negócios internacionais ou planejamento tributário, desde que seja informado, na declaração do Imposto de Renda, o saldo da conta no exterior. A informação deve ser enviada, anualmente, à Receita Federal e ao Banco Central. A origem do dinheiro também tem de ser lícita.
A função da offshore é gerenciar o dinheiro aplicado em outros países, que fica isento do pagamento de imposto ao Fisco brasileiro sobre ganhos de capital. A tributação só ocorre no momento da repatriação e caso o imposto não seja pago no momento em que o dinheiro retorna ao Brasil ou ainda quando não se informa à Receita Federal quanto ao envio e à manutenção do dinheiro numa offshore, ocorre o crime de “evasão de divisas”.
Hoje, no Brasil, pessoas ou empresas que possuem o equivalente a US$ 1 milhão ou mais no exterior estão obrigadas a declarar os valores ao Banco Central. A regra atual foi estabelecida pelo governo Bolsonaro, em 2020, através do Conselho Monetário Nacional (CMN), formado pelo ministro da Economia, pelo presidente do Banco Central e pelo secretário de Tesouro e Orçamento. Até julho de 2020, a regra era mais rígida. Exigia que a declaração fosse feita por pessoas e empresas que tinham valores acima de US$ 100 mil no exterior.
Segundo a reportagem Pandora Papers, o ministro da Economia, Paulo Guedes, tem a offshore Dreadnoughts International Group, nas Ilhas Virgens Britânicas, considerada um paraíso fiscal. Segundo a reportagem publicada no site da revista “piauí”, Paulo Guedes fez um depósito de US$ 8 milhões na abertura da empresa, em setembro de 2014. Depois, a cifra foi elevada para US$ 9,5 milhões, até agosto de 2015. O ministro mantém a empresa ativa.
Os documentos obtidos pelo consórcio de jornalistas revela que Paulo Guedes abriu a Dreadnoughts Internacional em sociedade com a filha dele, a empresária Paula Drumond Guedes. Ao criarem a empresa, transferiram para o Crédit Suisse, em Nova York, 50 mil ações de US$ 160 cada, o que totalizava US$ 8 milhões.
Diz ainda a reportagem que, em maio de 2015, a mulher de Paulo Guedes, Maria Cristina Bolívar Drumond Guedes, ingressou na offshore como acionista e diretora. E, durante o ano de 2015, o ministro Paulo Guedes, a mulher e a filha transferiram mais US$ 1,55 milhão para a offshore. Desde então, conforme os documentos obtidos pelo ICIJ, não houve novo aporte nem retirada de capital na empresa.
De acordo com a reportagem da “piauí”, devido à alta da taxa de câmbio desde que virou ministro, os US$ 9,55 milhões de dólares de Paulo Guedes nessa conta no paraíso fiscal tiveram uma valorização que chegou a R$ 14,5 milhões de reais.
Os dados obtidos pelo ICIJ mostram que o presidente do BC, Roberto Campos Neto, era dono da Cor Assets S.A., uma offshore com sede no Panamá, que também é considerado um paraíso fiscal. A empresa, segundo o consórcio, foi criada em 2004, com dois diretores: Roberto Campos Neto e a mulher dele, a advogada Adriana Buccolo de Oliveira. O aporte inicial foi US$ 1,09 milhão. Dois meses depois, foi feito um novo aporte de mais US$ 1,08 milhão na conta da empresa.
De acordo com a Pandora Papers, Campos Neto continuava como controlador da empresa quando assumiu o posto de presidente do Banco Central, em 2019. A offshore só foi fechada em março de 2020, cerca de 15 meses depois. Segundo o consórcio, não é possível saber quanto dinheiro Campos Neto tinha na empresa quando ela foi fechada.
O artigo 5º do Código de Conduta da Alta Administração Federal, de 2000, é taxativo: funcionários do alto escalão são proibidos de manter aplicações financeiras – no Brasil ou no exterior – que possam ser afetadas por políticas governamentais.
“É vedado o investimento em bens cujo valor ou cotação possa ser afetado por decisão ou política governamental a respeito da qual a autoridade pública tenha informações privilegiadas, em razão do cargo ou função, inclusive investimentos de renda variável ou em commodities, contratos futuros e moedas para fim especulativo, excetuadas aplicações em modalidades de investimento que a CEP venha a especificar”, diz o artigo.
As penas para quem infringe a regra vão de advertência à recomendação de demissão. Segundo o Código de Conduta, as autoridades públicas são obrigadas a declarar os bens que possuem à Comissão de Ética Pública em até dez dias após assumirem o cargo.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, e o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, responderam hoje (3) a matérias que afirmam que ambos teriam participações em offshores localizadas em paraísos fiscais. Os dois informaram que as empresas foram declaradas à Receita Federal, à Comissão de Ética Pública e às demais autoridades brasileiras competentes e não violam a legislação.
Em nota, o Ministério da Economia informou que toda a atuação privada de Paulo Guedes foi devidamente informada à Receita Federal, à Comissão de Ética Pública da Presidência da República e aos demais órgãos competentes. As informações foram prestadas no momento da posse, no início do governo, em 2019. “Sua atuação sempre respeitou a legislação aplicável e se pautou pela ética e pela responsabilidade”, destacou o texto.
O comunicado informou que Guedes se desvinculou de toda a atuação no mercado privado desde que assumiu o cargo de ministro, conforme exigido pela Comissão de Ética Pública. O texto acrescentou que o Supremo Tribunal Federal (STF) atestou a idoneidade de Guedes e a capacidade para exercer o cargo, no julgamento de uma ação impetrada pelo PDT contra o ministro da Economia.
Por meio da assessoria de imprensa, Campos Neto informou que as empresas estão declaradas à Receita Federal e foram constituídas há mais de 14 anos, com rendimentos obtidos em 22 anos de trabalho no mercado financeiro. Ele informou não ter feito nenhuma remessa de recursos para a Cor Assets após a nomeação para função pública.
Segundo Campos Neto, todo o patrimônio em seu nome, no país e no exterior, foi declarado à Receita Federal, ao Banco Central e à Comissão de Ética Pública. Ele disse ter pagado todos os impostos devidos, “com recolhimento de toda a tributação devida e observância de todas as regras legais e comandos éticos aplicáveis aos agentes públicos”.
A abertura de contas no exterior e a manutenção de offshores não são ilegais, desde que declaradas à Receita Federal e às demais autoridades. No entanto, o Código de Conduta da Alta Administração Federal proíbe que membros do alto escalam sejam administradores diretos de investimentos estrangeiros no Brasil e no exterior após assumirem funções públicas.
O presidente da Rússia, Vladimir Putin, não aparece nominalmente entre os mais de 300 citados nas reportagens do Pandora Papers. Mas pessoas próximas a ele constam da lista como donos de ativos em Mônaco. O melhor amigo do líder russo, Petr Kolbin, que é chamado de “a carteira” pelos críticos de Putin, são citados, assim como uma mulher com quem Putin supostamente teve um relacionamento.
O consórcio de jornalistas descobriu uma empresa foi constituída nas Ilhas Virgens Britânicas que abriria caminho para a participação secreta de 23% de Konstantin Ernst, o intelectual que reina como o principal criador de imagens de Vladmir Putin, em um acordo de privatização financiado pelo Estado no valor de um bilhão de dólares.
Arquivos vazados para o ICIJ informam que Ernst se tornou um parceiro secreto em um acordo para comprar 39 cinemas antigos, mas valiosos da era soviética e propriedades vizinhas da cidade de Moscou. O negócio foi financiado pelo VTB Bank, uma instituição estatal conhecida como o “cofrinho” de Putin.
As propriedades foram vendidas pelo preço mínimo estabelecido em um leilão administrado pelo governo de Moscou. Uma contestação legal alegou que o leilão foi projetado para excluir efetivamente tudo, exceto a parceria na qual Ernst, por trás de várias empresas de fachada, tinha uma participação.
Os arquivos vazados também mostram que Ernst foi o beneficiário de um empréstimo de US $ 16,2 milhões – de um banco cipriota parcialmente controlado pelo VTB – usado para financiar sua participação no negócio. Os arquivos mostram que o banco instruiu explicitamente os advogados offshore a manter os documentos detalhando a conexão de Ernst com o empréstimo fora dos registros do governo nas Ilhas Virgens Britânicas, onde as empresas de fachada que ocultaram o negócio foram incorporadas.
Além disso, os arquivos documentam como Ernst se juntou na parceria por uma figura da mídia russa que está ligada a alguns dos aliados mais próximos e poderosos de Putin, incluindo os chefes de Ernst no Channel One.
Em um e-mail para o ICIJ, Ernst disse que nunca fez segredo do envolvimento dele no projeto imobiliário e negou qualquer sugestão de que o envolvimento no projeto fosse uma compensação por seu trabalho nas cerimônias olímpicas, na Rússia. Ele se recusou a responder às perguntas do ICIJ com base no fato de que o ICIJ não era “uma empresa de investigação independente, mas uma organização encomendada pelos serviços secretos dos Estados Unidos”.
A coleção de documentos vazados obtidos pelo Consórcio Internacional de Jornalistas mostra que o Rei Abdullah II, possui secretamente 14 imóveis de luxo no Reino Unido e nos Estados Unidos, avaliados em 70 milhões de libras (R$ 508 milhões), que foram comprados entre 2003 e 2017, por meio de empresas de fachada registradas em paraísos fiscais.
Segundo a Pandora Papers, as propriedades ficam em Ascot, uma das cidades mais caras da Inglaterra; apartamentos no centro de Londres e três apartamentos de luxo em um complexo em Washington, DC, com vista panorâmica do rio Potomac, três casas à beira-mar em Point Dume, bairro elegante perto de Los Angeles, sendo uma mansão de sete quartos em uma falésia com vista para o Oceano Pacífico comprada em 2014 por uma das empresas de fachada do rei, a Nabisco Holdings, por US $ 33,5 milhões.
Os conselheiros do monarca, de 59 anos, não mediram esforços para ocultar os bens imobiliários, mostra a reportagem. Contadores e advogados na Suíça e nas Ilhas Virgens Britânicas formaram empresas de fachada em nome do rei e tramaram planos para proteger o nome dele dos documento públicos e até mesmo confidenciais do governo.
Em dois documentos, os administradores corporativos das BVI da empresa Alemán, Cordero, Galindo & Lee, mais conhecida como Alcogal, marcaram caixas para declarar que ninguém ligado a uma das empresas do rei estava envolvido na política – embora o rei tenha o poder de nomear governos, dissolver o Parlamento e aprovar legislação.
Escrevendo ao ICIJ em nome do rei, os advogados negaram qualquer coisa imprópria sobre a posse de casas por meio de empresas offshore. Segundo a lei jordaniana, o rei não é obrigado a pagar impostos, disseram os advogados.
Conhecido como um populista que luta contra as elites e o sistema, primeiro-ministro da República Tcheca, Andrej Babis, se vende como um gerente de negócios ansioso para consertar a economia do país e aumentar a transparência do governo e as receitas fiscais. Os documentos confidenciais obtidos pelos autores da Pandora Papers, mostra que o autoproclamado homem do povo esteve envolvido em “truques financeiros” para movimentar US $ 22 milhões, por meio de empresas offshore, para comprar uma luxuosa propriedade na Riviera Francesa em 2009, enquanto mantinha a propriedade em segredo.
O Chateau Bigaud de cinco quartos está situado entre ruínas medievais e florestas exuberantes. É uma joia escondida de Mougins, a vila no topo da colina onde Picasso passou os últimos 12 anos de sua vida. Em janeiro, os registros públicos mostravam que o castelo pertencia a uma subsidiária de uma das empresas tchecas indiretamente mantida pelo primeiro-ministro, Babis.
Especialistas entrevistados pelo ICIJ disseram que o arranjo offshore usado por Babis reduziu a conta de impostos ao mesmo tempo em que escondia do público o imóvel de sua propriedade.
O primeiro-ministro tcheco não respondeu aos pedidos de comentários. O ICIJ e três parceiros de mídia enviaram uma lista de perguntas detalhadas sobre a compra do castelo ao porta-voz do primeiro-ministro, Jana Adamcova, que não ofereceu nenhuma resposta, além de confirmar o recebimento.
O presidente do Quênia, Uhuru Kenyatta, e seis pessoas da família dele, são sócios de uma rede de empresas com sede em outros países: são 11, no total. Uma delas têm cerca de 30 milhões de libras (cerca de R$ 218 milhões).
Filho do primeiro presidente do Quênia e líder de uma das maiores economias da África, Uhuru Kenyatta, de 59 anos, pediu aos legisladores que se juntassem a ele na luta contra a corrupção e mais uma vez declarou “a centralidade da transparência, responsabilidade e boa governança como âncoras do desenvolvimento sustentável”. Mas os documentos vazados pela Pandora Papers mostra que a família de Kenyatta há anos vem acumulando secretamente uma fortuna pessoal, adquirida por meio de offshores.
Kenyatta, junto com sua mãe, irmãs e irmão, há décadas usam fundações e empresas em paraísos fiscais, incluindo o Panamá, com ativos no valor de mais de US$ 30 milhões, de acordo com documentos obtidos pelos jornalistas investigativos. Os documentos – do escritório de advocacia panamenho Aleman, Cordero, Galindo & Lee (Alcogal) – mostram que a família possuía pelo menos sete offshores, duas registradas anonimamente no Panamá e cinco nas Ilhas Virgens Britânicas.
Uma das empresas possuía uma casa no centro de Londres, e duas outras empresas possuíam carteiras de investimentos no valor de dezenas de milhões de dólares. A riqueza offshore dos Kenyattas, revelada aqui pela primeira vez, representa parte de uma fortuna familiar estimada de meio bilhão de dólares acumulada em um país onde o salário médio anual é inferior a US$ 8.000 por ano.
Os documentos mostram que, em julho de 2003, um advogado da Union Bancaire Privée, Othmane Naïm, pediu a especialistas offshore do Panamá que ajudassem a registrar uma nova fundação, conhecida como Fundação Varies, projetada para administrar e proteger a riqueza de seus beneficiários. O estatuto da Fundação Varies, também de julho de 2003, nomeia como beneficiários Uhuru Kenyatta e mãe dele. Mais tarde, mostram os documentos, a Union Bancaire Privée ajudou a criar uma fundação para o irmão de Uhuru, Muhoho.
As faturas da Alcogal, no Panamá, mostram que os consultores suíços se referiam aos Kenyattas com um código: “cliente 13173”. A Alcogal disse que cumpre os requisitos onde opera e “realiza diligência devida melhorada em um cliente que está determinado a ser um cliente de alto risco”. Ele disse ao parceiro de mídia do ICIJ, Finance Uncovered, que não presta serviços às fundações dos Kenyattas desde 2014. As fundações poderiam ser suspensas, de acordo com a lei panamenha, por não pagarem impostos anuais, disse Algocal.
Naim disse ao ICIJ que não poderia responder a perguntas específicas, mas disse que “sempre cumprimos todas as legislações e regulamentações aplicáveis”.
De acordo com a lei queniana, o presidente deve fornecer uma lista de interesses financeiros ao Ministério das Finanças a cada ano. Kenyatta e seus familiares não responderam aos pedidos de comentários, incluindo se ele declarou qualquer interesse offshore ou foi obrigado a fazê-lo.
“O que possuímos, o que temos, está aberto ao público”, disse Kenyatta à BBC, em 2018, referindo-se à riqueza de sua família. “Se houver uma instância em que alguém pode dizer que o que fizemos não foi legítimo – diga isso.”
Ele continuou: “Os bens de todos os funcionários públicos devem ser declarados publicamente para que as pessoas possam questionar e perguntar, o que é legítimo? Se você não consegue se explicar, incluindo a mim mesmo, então tenho um caso para responder.”
O presidente do Equador, o ex-banqueiro Guillermo Lasso, usava uma fundação com sede no Panamá para pagar “mesadas em dinheiro” todos os meses para familiares. Ele parou de dar dinheiro aos parentes dessa forma e agora ele usa um truste (uma espécie de fundo) com base no estado de Dakota do Sul, nos Estados Unidos, para fazer esses pagamentos.
Os documentos vazados mostram que o presidente eleito em abril, transferiu ativos para dois fundos, em dezembro de 2017, três meses depois que o parlamento do Equador aprovou uma lei que proíbe funcionários públicos de manter ativos em paraísos fiscais. Os registros mostram que Lasso transferiu duas empresas offshore para os fundos de Dakota do Sul de duas fundações secretas no Panamá.
Lasso disse que cumpre a lei equatoriana porque o uso anterior de entidades offshore era “legal e legítimo”. Os trustes estabelecidos em Dakota do Sul e em muitos outros estados dos EUA permanecem envoltos em sigilo, apesar da promulgação deste ano da Lei de Transparência Corporativa federal, que torna mais difícil para os proprietários de certos tipos de empresas ocultar suas identidades.
“Claramente, os EUA são uma grande brecha no mundo”, disse Yehuda Shaffer, ex-chefe da unidade de inteligência financeira israelense. “Os EUA estão criticando todo o resto do mundo, mas em seu próprio quintal, esse é um problema muito, muito sério.”
Presidente do Equador, Guillermo Lasso
Os documentos publicados na reportagem Pandora Papers revelam que membros-chave do círculo íntimo do primeiro-ministro do Paquistão, Imran Khan, incluindo ministros de gabinete, familiares e grandes financiadores, possuem secretamente uma série de empresas e fundos que detêm milhões de dólares de riqueza oculta. Líderes militares também foram implicados. Os documentos não contém nenhuma sugestão de que o próprio Khan seja dono de empresas offshore.
Entre as pessoas com propriedades expostas estão o ministro das finanças de Khan, Shaukat Fayaz Ahmed Tarin (foto), e sua família, e o filho do ex-conselheiro de Khan para finanças e receitas, Waqar Masood Khan. Os registros também revelam as negociações offshore de um importante doador da PTI, Arif Naqvi, que enfrenta acusações de fraude nos Estados Unidos.
Os arquivos mostram como Chaudhry Moonis Elahi, um importante aliado político de Imran Khan, planejou colocar os lucros de um suposto negócio corrupto em um fundo secreto, ocultando-os das autoridades fiscais do Paquistão. Elahi não respondeu aos repetidos pedidos de comentários do ICIJ.
Em uma das várias propriedades offshore envolvendo líderes militares e suas famílias, há um luxuoso apartamento, em Londres, que foi transferido do filho de um famoso diretor de cinema indiano para a esposa de um general de três estrelas. O general disse ao ICIJ que a compra da propriedade foi divulgada e apropriada; esposa dele não respondeu.
A janela para as finanças pessoais de generais paquistaneses individuais é especialmente rara e fornece um vislumbre de como os principais oficiais militares – conhecidos no Paquistão como “O Sistema” – usam offshore para enriquecer silenciosamente, enquanto mantém, até agora, a imagem dos militares como baluarte contra a corrupção civil.
Nas 48 horas que antecederam a publicação dos Pandora Papers, uma estação de televisão paquistanesa, ARY-News, relatou que “o proprietário de duas empresas offshore registradas em um endereço semelhante ao do primeiro-ministro Imran Khan revelou que estavam registradas por ele em um endereço diferente e negou qualquer papel do premier a esse respeito”. A reportagem também atribuiu a informação a “um banco de dados das empresas offshore”.
ARY-News não é um parceiro do ICIJ e não tem acesso aos dados do ICIJ.
Em questionamento anterior à publicação, o ICIJ perguntou a Khan sobre as mesmas empresas. Um porta-voz de Khan disse ao ICIJ que o primeiro-ministro não tinha ligação com nenhum dos dois, acrescentando que duas casas no mesmo bairro compartilham um endereço, fornecendo um mapa como evidência.
O porta-voz também disse à ARY-News que Khan negou qualquer conexão com as empresas, acrescentando que o proprietário “nunca se encontrou com Imran Khan cara a cara e, no entanto, pode ser possível que eles tenham participado de uma reunião familiar extensa”.
A investigação Pandora Papers expõe o governo civil e líderes militares que têm escondido grandes quantidades de riqueza em um país atormentado pela pobreza generalizada e evasão fiscal.
Os registros recém-vazados revelam o uso de serviços offshore pelas elites do Paquistão que rivalizam com as descobertas dos Panama Papers, que levaram à queda de Sharif e ajudaram a impulsionar Imran Khan ao poder há três anos.
No domingo (3/10), algumas horas antes da publicação dos Pandora Papers, o porta-voz de Khan disse em uma entrevista coletiva que o primeiro-ministro “não tem empresa offshore, mas se algum de seus ministros [ou] conselheiros tiver, serão seus atos individuais e eles terão que ser responsabilizado”. Acrescentou que os bens da família “são declarados de acordo com a legislação aplicável”.
Com informações do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ)
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