Mais do que comemoração, o Dia da Favela, idealizado pela Central Única das Favelas (CUFA), será marcado por reflexão sobre os problemas existentes nesses territórios, como os históricos de descaso e a negligência demandados a esses lugares e seus moradores. Contudo, também haverá a exaltação da representatividade, da resiliência e da potência presentes nas favelas.
Dentro da programação, que envolve favelas de todo o Brasil, acontecerá uma série de debates, palestras e shows, promovidos por diversas instituições que atuam nesses locais. O grande homenageado da 16ª edição do Dia da Favela será o sambista Arlindo Cruz, que sempre poetizou a favela em suas letras, sem se esquecer do lugar de onde veio, marcando suas composições.
“A gente não deve comemorar a existência das favelas, mas deve, sim, celebrar as mais diversas manifestações culturais, artísticas, sociais, de honestidade, de solidariedade que existem e são marca dessas pessoas que vivem nesses lugares. Isso, sim, precisa ser celebrado e festejado. A ideia é comemorar a resiliência, a força, a autenticidade, e a agenda positiva tão presente nesses territórios”, explicou Nega Gizza, rapper, produtora de eventos em favelas e fundadora da CUFA.
Além de Arlindo Cruz, outros artistas também irão participar da ação, como o cantor Dudu Nobre e Leci Brandão. No Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, acontecerão outras ações como a plantação de 20 “mudas de favela”, responsável pela origem do nome.
Para engajar ainda mais as pessoas, um videochamada sobre o Dia da Favela também foi produzido, com duração de 1m15s, para que as televisões e rádios que queiram entrar nessa jornada de divulgação de uma agenda positiva para a favela possam transmitir e perpetuar as ações. Os veículos que desejarem participar do movimento podem solicitar esse material para a CUFA.
“A favela tem uma enorme contribuição para a existência e desenvolvimento desse país. Foi o território que mais sofreu na pandemia, mas que também foi pra rua fazer os serviços que contribuíram para o asfalto permanecer em home office, evitando um caos maior”, destaca Preto Zezé, presidente nacional da CUFA. “Por isso, 4 de novembro é dia de celebrar a força, a dignidade, resiliência, a luta e as conquistas da favela”, concluiu Zezé.
No Ceará, a CUFA seguirá fazendo ações que incluem, além da programação nacional, um encontro de grafiteiros, no qual os artistas irão pintar seus rostos em um corredor de casas do Barroso II, para simbolizar os cuidados com a Covid, por meio de pinturas, retratando os rostos dos moradores com máscaras. O local também receberá jogos de tabuleiros.
Para os mais jovens, a CUFA irá realizar um Campeonato de Travinha Infantil na região do Poço da Draga. A ação terá início às 17h. A quadra de esportes da comunidade receberá o torneio com a realização assinada pela CUFA Ceará e Farol da Juventude, em parceria com o Instituto Iracema e Centro Cultural Belchior. A atividade é destinada às crianças de 5 a 14 anos e as inscrições estarão acontecendo no local.
Além das atividades, a CUFA Ceará também realizará a doação de 8 toneladas de alimentos, que irão beneficiar moradores do Barroso II, Couto Fernandes, Quadras, Areal e Poço da Draga.
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Dia 4 de novembro é o Dia da Favela. A data foi escolhida, por ser o dia em que a expressão favela apareceu pela primeira vez em um documento oficial. Isso aconteceu no Rio de Janeiro, em 1900, quando o então delegado da 10ª Circunscrição e o chefe da Polícia da época, Enéas Galvão, redigiram um documento se referindo ao Morro da Providência como favela, um lugar que precisava ser limpado, associando aquele território como um lugar sujo, de gente imoral, entre outros adjetivos negativos. Hoje, a Providência é considerada a primeira favela do Brasil.
O nome “Favela” surgiu a partir de uma árvore do cerrado da caatinga. Entre 1896 e 1897, milhares de sertanejos, liderados por Antônio Conselheiro, fundaram a comunidade de Canudos no interior da Bahia. Canudos ficava localizado próximo de um monte chamado ‘Morro da Favela’.
O morro assim era chamado pois lá cresciam muitas favelas, plantas euforbiáceas espinhosas, xerófilas, bastante resistentes à estiagem. Favela é diminutivo de fava (planta leguminosa, como os feijões). Suas sementes são parecidas com as da fava. O nome comum, favela, apareceu, entretanto, por escrito só em 1902 na obra ‘Os Sertões’ de Euclides da Cunha.
Nesse livro, Euclides explica a Guerra de Canudos, o conflito entre os seguidores de Conselheiro e o Exército Brasileiro, e cita, em certos trechos, tanto a favela quanto o Morro da Favela. Depois do massacre de Canudos, os soldados voltaram para o Rio de Janeiro, na época, a então capital republicana.
Após a guerra, deixaram de receber seus salários, e, por falta de melhores condições, foram morar no Morro da Providência, região central do Rio de Janeiro. As manchas que a planta deixou no corpo deles, fez com que eles ficassem conhecidos como “favelados” e o local onde moravam, como favela.
Em 2006, o Dia da Favela virou lei no município do Rio. E, em 2019, se tornou lei no estado. Atualmente é lei em diversos estados e municípios brasileiros.
Presente há mais de 20 anos nas favelas brasileiras, a Central Única das Favelas (CUFA) promove atividades nas áreas de educação, lazer, esportes, cultura e cidadania, utilizando ferramentas como grafite, DJ, break, rap, audiovisual, basquete de rua, literatura, entre outros. Além disso, promove, produz, distribui e veicula a cultura hip hop, por meio de publicações, discos, vídeos, programas de rádio, shows, concursos, festivais de música, cinema, oficinas de arte, exposições, debates e seminários. Desta forma, a CUFA promove a integração e inclusão social.
Entre os principais projetos da instituição destacam-se o Hutúz Rap Festival, maior evento de hip-hop da América Latina, a LIBRA, Liga Internacional de Basquete de Rua e a Taça das Favelas, maior campeonato de futebol entre favelas do mundo.
Durante a pandemia do Covid-19, a CUFA utilizou sua capilaridade para conectar a favela e amenizar ao máximo as dificuldades que os moradores de favela enfrentam. Com o programa Mães da Favela, a instituição entregou cestas básicas, física e digital, e chips com internet gratuita por 6 meses, garantindo assim uma segurança alimentar maior e a educação de muitas crianças, que precisaram migrar para as aulas online. Os benefícios são direcionados às mulheres das favelas, que chefiam os seus lares. Por seu conhecimento sobre esses territórios, a CUFA entendeu que ao apoiar essas mulheres, era possível criar uma rede de proteção muito maior e com isso o projeto já atendeu a mais de 6 milhões de pessoas.
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