Um linfoma, tipo de câncer no sangue, mudou do dia pra noite a rotina da repórter Marina Alves, da TV Verdes Mares, afiliada da Globo no Ceará. No dia 9 de agosto, durante as participações no Bom Dia Ceará, a jornalista, de 32 anos, contou que começou a se sentir mal. “Era uma sensação de entalo. Parecia que o meu coração batia na goela. Parei em uma farmácia, vomitei, optei por não comunicar e ainda entrei mais uma vez ao vivo” relatou na rede social Instagram.
Depois do jornal a repórter decidiu seguir para um hospital, onde fez exames. Ao chegar em casa, recebeu uma mensagem do hospital pedindo que ela retornasse urgente. “Uma taxa do exame de sangue, a Troponina T, tinha dado muito alterada. Era como se eu estivesse tendo um infarto”, contou.
Desde então, foram exames e mais exames foram feitos até que os médicos chegarem à conclusão de que era necessário iniciar o tratamento de quimioterapia para amenizar os sintomas do linfoma, enquanto não surge um doador compatível de medula óssea.
Marina Alves está internada no Hospital Regional da Unimed, em Fortaleza, fazendo o tratamento que depende, além da quimioterapia, de bolsas de sangue e plaquetas para as transfusões. Enquanto isso, os amigos da jornalista no Ceará, no Brasil e no exterior fazem uma campanha pelas redes sociais para incentivar a doação de sangue, plaquetas e, principalmente, de medula óssea.
Casos como o da jornalista Marina Alves, que necessita de um transplante de medula óssea, não são raros no Brasil. Em 2021, até agosto passado, foram feitos no Brasil 200 transplantes, sendo 140 com doadores brasileiros cadastrados no Registro Nacional de Doadores Voluntários de Medula Óssea (Redome). O banco de doadores do Brasil também beneficiou este ano em torno de 20 pacientes de outros países.
Encontrar um doador compatível não é tarefa fácil. Mesmo entre irmãos dos mesmos pais, a chance de compatibilidade é de apenas 30%. Tentar identificar doadores compatíveis com o paciente que necessita do transplante é um dos maiores desafios das equipes médicas, familiares, amigos e dos próprios pacientes como Marina, que continua ativa nas redes sociais. “Eu sou filha única. E a chance de encontrar um doador que não é aparentado é de 1 em 100 mil. Por isso, quanto mais doadores cadastrados no Redome, maiores as minhas chances. E de milhares de pessoas que, assim como eu, têm sede de viver”, declarou a jornalista.
O Redome é coordenado pelo Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (Inca), que decidiu investir em tecnologia para tentar agilizar esse encontro entre doadores e pacientes. Um aplicativo de celular, apresentado neste sábado (18/9), no Rio de Janeiro, torna mais fácil a atualização de dados de doadores e facilita o pré-cadastro de interessados na doação de órgãos. A apresentação do aplicativo faz parte da comemoração do Dia Mundial do Doador de Medula Óssea 2021 (WMDD, do nome em inglês).
O aplicativo está disponível para celulares com sistema iOS e Android. Desde janeiro deste ano, o aplicativo está sendo usado em caráter experimental para pré-cadastro de novos inscritos no Redome nos estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Ceará. Os primeiros resultados mostram que foram feitos, até agosto, 13.021 downloads do aplicativo. Dos 486 pré-cadastros efetuados, 129 pessoas se dirigiram a um hemocentro para finalizar a inscrição.
A coordenadora técnica do Redome, médica Danielli Oliveira, destacou que, para funcionar como pré-cadastro em nível nacional, o hemocentro estadual tem que fazer o cadastro também usando os dados do aplicativo. “A gente está convocando os nossos hemocentros para que entrem no aplicativo. Ele não é obrigatório”, afirmou.
Danielli observou que o aplicativo já permite a atualização de dados pessoais daqueles que estão há mais tempo no registro, como mudança de telefone e endereço, o que é fundamental para a rápida localização do doador compatível.
Reforçou que o aplicativo tem duas funções. “Para o pré-cadastro, depende do hemocentro do estado que está usando. O que qualquer doador já pode fazer no aplicativo é atualizar o seu cadastro. Isso é muito importante porque a gente tem sempre aquele desafio de atualização do cadastro para a localização do doador. E a gente sempre aproveita essa data do Dia Mundial do Doador para chamar a atenção para a necessidade de atualização do cadastro”, disse. A data mundial é comemorada sempre no terceiro sábado de setembro.
Atualmente, estão cadastrados no Redome 5,4 milhões de doadores, dos quais 120 mil entraram este ano. A coordenadora técnica do Redome informou, também, que a atividade de transplante este ano está maior do que em 2020, quando sofreu impactos da pandemia de covid-19. Salientou, entretanto, que “o impacto não foi sobre os doadores, mas sobre os serviços. Os pacientes ficaram com medo de transplantar, os hospitais ficaram muito afetados. Isso aconteceu este ano também. Os doadores, apesar de todas as restrições, continuaram doando”, explicou.
Em 2020, foram efetuados 279 transplantes de medula óssea no país, contra 411 em 2019. “Na verdade, vínhamos numa crescente e fomos afetados pela pandemia. Mas não fomos atingidos porque houve menos doadores cadastrados. A redução do número de transplantes não afetou a chance de encontrar um doador, nem os doadores deixaram de doar. Foi uma conjuntura de fatores”, reforçou. “Os serviços foram muito atingidos”. De 2018 para 2019, o total de transplantes no Brasil subiu de 380 para 411.
Danielli admitiu que, este ano, o programa de transplantes de medula óssea no Brasil não será capaz de recuperar o ritmo de 2019. A meta é superar o total registrado em 2020. “Eu gostaria que passasse de 300 este ano”, frisou a médica do Inca/Redome. A expectativa é que os números melhorem ainda mais com a ampliação do uso do aplicativo por doadores de todo o Brasil.
Moradora da cidade de Fernandópolis, interior de São Paulo, Lilian Alves de Lima, 34 anos, foi diagnosticada com leucemia mieloide aguda em dezembro de 2019. Ela precisava de um transplante de medula óssea, porém, ninguém da família era compatível. Com alguns meses de espera, uma doadora foi localizada por meio do Redome e aceitou fazer o procedimento.
“Eu tive a vida salva por uma pessoa que não me conhece. É um peso muito grande, você sente muita empatia quando percebe que alguém que nunca te viu escolheu te salvar. Um ato tão simples, como se cadastrar em um aplicativo ou só atualizar seus dados, pode mudar a esperança e a vida de alguém”, acentuou.
A Associação Mundial de Doadores de Medula Óssea (WMDA, do nome em inglês World Marrow Donor Association) vai celebrar o Dia Mundial do Doador, neste sábado, com transmissão, durante 24 horas, de vídeos e fotos de homenagens e histórias inspiradoras de doadores, pacientes e familiares de todo o mundo. Por conta da pandemia, o Redome não fará nenhum evento presencial, mas enviou um vídeo à WMDA e está convocando toda a sua rede de hemocentros, centros de transplante e organizações não governamentais (ONGs), além de pacientes e doadores, para participar da campanha. A WMDA é uma organização global de registros, que representa mais de 38 milhões de doadores voluntários de 55 países.
Com informações da Agência Brasil
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